Rubens Pinto Lyra (*)
Dentre eles, o de maior impacto para o Brasil, o praticado em 2016 pelo
Congresso Nacional – quando, submerso na corrupção, decretou o
impeachment da Presidente Dilma Rousseff, ao atribuir-lhe crime de
responsabilidade.
Desde então, é como se o deboche se tivesse naturalizado, tornando-se
corriqueiro. Comportamentos dessa natureza produziram indignação em
muitos, mas na maioria despolitizada, gélida indiferença, tendo sido por ela
interiorizados como legal e necessário.
Com efeito, quando a mentira e o auto engano se instalam, tendo como
transmissor o monopólio midiático, fica difícil lhes contrapor a verdade, até
porque, tendo sido eliminado o contraditório, só se destaca uma única
opinião, o que caracteriza um regime com ranço totalitário.
É precisamente o que ocorre com as propaladas reformas neoliberais:
privatização, reforma da Previdência Social e a da CLT, sempre associadas às
virtudes do “Estado mínimo. Sem sua aprovação, segundo a mídia, a economia
não avança, e, consequentemente, também não, o progresso social.
Nesse contexto, há escárnios que se sobressaem em relação aos demais,
como o cometido contra o erário público, como foi o perdão, no ano de 2016,
das dívidas das teles (10 bilhões perdoados a OI), o que clama aos céus, por
três razões. Primo: interesses privados são contemplados, em detrimento do
Erário público. Secundo: essas operações ocorre à sorrelfa, sem qualquer tipo
de satisfação à opinião pública. Tercius: esse mimo é ofertado justamente às
empresas cujos serviços se destacam pela sua inexcedível má qualidade.
Outro escárnio, de incomensurável valor simbólico, vindo de uma juíza
de alto coturno, a ex-Ministra dos Direitos Humanos, Desembargadora Luizinda
Valoi, ofendeu milhões de brasileiros carentes da proteção de seus
fundamentais.
Ao pretender que seu salário de mais de trinta mil reais não lhe
permite comer, vestir-se e se calçar decentemente, assemelhou a sua situação à
dos escravos (não recebendo um segundo salário, sendo aposentada,
trabalharia gratuitamente).Necessitaria,portanto, de mais de 60 mil reis para
dissociar sua condição econômica da dos que foram escravizados.
Ela, que deveria ser especialmente sensível às violações de direitos
humanos, sequer se dá conta de que as diferenças salariais abissais no serviço
público brasileiro é um dos mais fortes indicadores do alto grau de exclusão
social, incompatíveis com aqueles direitos.
Um dos mais recentes – e impactante – escárnio, tem como autor o Presidente
da Argentina, Xavier Milei, fiel amigo de Bolsonaro e expoente da extrema-
direita. Alegando a necessidade de salvação da Pátria, elaborou um mega
pacote econômico, ilegal, por ser inconstitucional; ilusório por não ser capaz de
resolver os problemas objeto de sua decretação e profundamente injusto por
atingir gravemente os direitos sociais dos trabalhadores. Nec plus ultra, mas
apenas para ínfima minoria de endinheirados.
A questão é, na verdade, eminentemente política, sendo perfeitamente
inconsequente proceder, como faz a maioria do eleitorado, que aponta a
corrupção endêmica como sendo a causa de todos os males.
Ao eleger falsos mitos, supostamente salvadores da Pátria, deixa de lado
o que é essencial: fortalecer as personalidades e partidos que denunciam a
principal pilhagem, aquela que atinge frontalmente os interesses nacionais e as
necessidades mais elementares da classe trabalhadora.
É, portanto, indispensável se opor com todas as suas forças a programas e
iniciativas capazes de comprometer o presente e o futuro da nação. Somente o
exercício ativo do inconformismo político, por parte do povo argentino, o
tornará capaz de dar a volta por cima e descobrir, ainda que penosamente,
nessa práxis de resistência, a luz no túnel.
(*) Professor Emérito da UFPB. Autor, entre outros, de Bolsonarismo: ideologia,
psicologia, política e temas afins (2021) e Teoria política: dos clássicos à
contemporaneidade (2022).
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