Por: | 08/02/2024
LETRA LÚDICA
Hildeberto Barbosa Filho
Autores e livros
Everaldo Dantas da Nóbrega
São
muitas as facetas da cultura popular. Repositório de informações e conhecimentos, acervo inesgotável de feitos e exemplos, a cultura popular detém, em suas diversas modalidades, um veio permanente de sabedoria. Há mesmo uma poesia, simples, espontânea, ingênua, demarcando seus registros orais e escritos na pauta de suas variadas manifestações.
É lendo, lendo e me descontraindo..., as Histórias, estórias, causos (João Pessoa: Ideia, 2024), de Everaldo Dantas da Nóbrega, que me vêm estas reflexões. Aqui, sem correr os riscos inevitáveis dos gêneros criativos, em especial a ficção e a poesia, Everaldo faz a recolha do lendário e da factualidade, atento, sobretudo, à esfera pitoresca, insólita, jocosa, dos tipos e dos acontecimentos.
Histórias com “H”, certamente sinalizando para eventos reais. Estórias com “E”, remetendo para episódios imaginários. E “Causos”, variante de casos, isto é, de pequenas fabulações que podem ilustrar o rico manancial de ocorrências da vida ordinária, com sua verdade surpreendente ou com o espanto de suas realizações.
O trágico, o cômico, o grotesco, o escatológico, o banal, o chistoso, o inusitado, o reles se mesclam na sequência da contação que o autor promove em cada página. Everaldo Dantas da Nóbrega, à maneira dos antigos narradores orais, desfia o tecido das lembranças e explora os ecos da memória, recuperando, assim, os ingredientes de um repertório coletivo que jaz, olvidado, nas pátinas do tempo.
Se se desvia dos atalhos, quase sempre ásperos e ardilosos, da palavra do escritor, em suas intrínsecas exigências estéticas, segue, no entanto, o caminho certo do organizador e do antologista do imaginário social, naquilo que ele contém de atrativo e sedutor. Seus “causos”, narrados com singeleza e concisão, constituem, para o leitor, um apreciável conjunto de dados da história das mentalidades e do ethos característico de um povo e de uma região. O sertão e o sertanejo.
Um Câmara Cascudo, um Veríssimo de Melo, um Horácio de Almeida, um Coriolano de Medeiros, um José Cavalcanti, um Manoel Monteiro, todos comprometidos com a indispensável herança da cultura popular, decerto leriam, com gosto, este curioso livrinho do advogado e homem de letras, Everaldo Dantas da Nóbrega.
Revista da APL
“Se a palavra se cala, ∕ o universo desaba”. Versos do poeta Vanildo Brito (1937-2008), que servem de epígrafe à Revista da Academia Paraibana de Letras, Ano LXX, janeiro∕abril, 2023, número 18. Sem dúvida: a palavra, oral ou escrita, é a alma da instituição.
A revista, ora em circulação, assim como todos os exemplares anteriores, me parece o documento seminal da Casa. Casa das letras. Casa da palavra. Casa de Coriolano de Medeiros. Não importa. O que importa mesmo é que a Revista está aí. O que importa mesmo é a que a Revista nunca deveria parar. Quem sabe, pelo menos um número, a cada semestre.
Para mim, que integro o seleto quadro de sócios efetivos, a Revista, mais que certos eventos pomposos ou certos rituais burocráticos, é o que, de fato, pode dignificar a imagem científica, cultural e literária da Casa. É nela por onde transitam as ideias e o pensamento dos acadêmicos e onde se recolhem e se ordenam os elementos conceituais de sua história cotidiana.
A oratória, o ensaio crítico, a poesia, a crônica, o noticiário, tudo conta na configuração de suas páginas e na oferta cognitiva que proporciona. Outros gêneros, a exemplo da entrevista, das memórias, da ficção, do diário, das cartas, entre outros, poderiam ampliar o leque de seus interesses e motivações.
De outra parte, penso que a Revista não deveria se restringir apenas aos cômodos institucionais. Não é somente os acadêmicos que devem ter acesso a ela. Algo deveria ser feito para torná-la mais visível, interna e externamente. Talvez um lançamento em que a Revista fosse, rigorosamente, o protagonista nuclear do acontecimento. Talvez um seminário acerca de seu diversificado conteúdo.
Isto porque a Revista, não só resguarda e preserva a memória da Casa, porém, sobretudo, porque preserva e guarda o conteúdo histórico e cultural da cidade e do estado. De fato: “Se a palavra se cala ∕ o universo desaba”.