Geraldo Vandré completa 90 anos em dia emblemático para a América Latina

Geraldo Vandré completa 90 anos em dia emblemático para a América Latina
12/09/2025

Compositor de “Caminhando”, o hino contra a ditadura militar, tem um legado enorme, feito em um curto espaço de tempo

Escrito em Opinião

Em uma confluência de incríveis coincidências, neste 11 de setembro – data em que aniversariam tenebrosas transações: o golpe militar no Chile dado por Pinochet e os atentados às torres gêmeas e ao Pentágono, nos EUA – o ex-presidente Jair Bolsonaro e seus aliados foram duramente condenados pela trama golpista.

Dia seguinte, com o país em meio a uma enorme ressaca cívica, o cantor e compositor paraibano Geraldo Vandré completa inacreditáveis 90 anos de vida. O artista, como se sabe, foi um dos mais perseguidos pela malfadada ditadura militar nos anos 60 e 70 no Brasil. A causa, como se sabe, foi, sobretudo, a canção “Pra não dizer que não falei das flores”, que ganhou o apelido abreviado de “Caminhando”. Nela, Vandré lembrava os “soldados armados, amados ou não, quase todos perdidos de armas na mão”.

Caetano Veloso, colega de profissão, contemporâneo e também participante dos lendários festivais da TV Record, afirmou em entrevista ter ouvido durante a sua prisão pelos militares, que se Vandré fosse encontrado, seria morto. A essas alturas, em 1970, o compositor já havia se exilado em Paris, onde gravou seu último e mais emblemático álbum “Das Terras do Benvirá”.

Censurado

O disquinho, na época um compacto simples, com a canção “Caminhando”, ficou terminantemente proibido durante anos seguidos. Lembro bem que a gente era obrigado a ouvi-lo baixinho, todos em torno da vitrolinha Sonata do Seu Júlio, como se fosse um hino. E, de fato, foi o que se tornou. A canção era bradada em manifestações que, invariavelmente, acabavam com muita porrada e gás lacrimogêneo. Veio, enfim, a anistia e ela perdeu um pouco a graça, com seus dois acordes e a melodia repetitiva.

O restante da obra de Vandré, no entanto, permanece até hoje como uma das belas e seminais da nossa música. Um tanto folclorizada e extremamente politizada, sua música tem sido frequentemente resgatada em novelas, filmes, documentários. São apenas cinco álbuns, todos influenciados pela canção nordestina.

Em ao menos um deles, o “Canto Geral”, vale o destaque para a participação do lendário Quarteto Novo, que contava com Hermeto Paschoal, Airto Moreira, Theo de Barros e Heraldo do Monte.

Nestes álbuns, canções poderosas como “Réquiem para Matraga”, “Porta Estandarte”, “Aroeira”, “Ventania” e, é claro a inesquecível “Disparada”. Sobre ela, o mesmo Caetano comentou a respeito do empate entre ela e “A Banda”, de Chico Buarque, no 2º Festival de Música da TV Record em 1966. Segundo o compositor baiano, “Disparada”, feita em parceria com Theo de Barros, era de longe a melhor canção de Vandré, enquanto “A Banda” não era nem de longe a melhor do Chico.

Com o fim da ditadura, Vandré voltou ao Brasil e passou a ter uma vida discreta, com raras aparições em entrevistas. Nesta sexta-feira, 12 de setembro, em um dia emblemático para a América Latina e para o mundo, ele completa 90 anos. Um artista que tem um legado enorme e, ao mesmo tempo, curto.


FONTE: Revista Fórum (revistaforum.com.br)

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