João Batista de Brito
João Batista de Brito
João Batista de Brito

EU E O GRUPO SANHAUÁ

Por: | 24/10/2025

EU E O GRUPO SANHAUÁ

João Batista de Brito

Meses atrás, no suplemento Correio das Artes, o escritor e crítico Clemente Rosas fez um belo e pertinente relato da “Geração 59”, movimento poético paraibano do qual ele mesmo fez parte. Fechando o relato, Rosas adicionou breve referência ao movimento que veio em seguida, no caso, o chamado “Grupo Sanhauá”, e – coisa engraçada! – citou três nomes de poetas integrantes desse Grupo: Sérgio de Castro Pinto, Hildeberto Barbosa Filho e João Batista de Brito.

Achei engraçado, pois, como é sabido, eu e Hildeberto não fizemos parte do Sanhauá.

Hildeberto não o fez por motivos cronológicos: em 1963, quando esse movimento poético desabrochou (edição de “Alguns Gestos” de Marcos dos Anjos), ele devia ter cerca de nove anos de idade. Poeta nato, é possível que o pequeno Hildeberto já rabiscasse versos nas areias quentes do seu encantado Sítio Serafim, mas não consta que os haja publicado.

Quanto a mim, como se sabe, nunca fui poeta e, portanto, não poderia, embora tivesse idade para tanto, ter feito parte do Grupo.

De qualquer forma, aproveito o generoso descuido do nosso querido e admirado Clemente, para tratar das relações que, de fato, tive com o Grupo Sanhauá, como se verá, relações periféricas, mas concretas e, afinal de contas, para mim, consequentes.

Na época da criação do Grupo pelo animador cultural Marcos dos Anjos, eu estava nos meus dezessete anos de idade e fazia o segundo ano do curso clássico no Liceu paraibano. Gostava de literatura, cinema e línguas, porém, como mero consumidor, e um consumidor ingênuo, sem experiência e sem fundamentos.

Como já contei alhures, tive a sorte de estudar português com o grande professor Jairo Guedes que, deixando a gramática de lado, centrava suas aulas em literatura, e cobrava do alunado resenhas e ensaios sobre poesia e prosa.

Pois foi nessa mesma sala de aula esquentada que conheci e fiquei amigo do poeta Marcus Vinicius de Andrade, já então um dos membros mais vibrantes do Grupo Sanhauá. Ora, nos primeiros dias de aula no Liceu, descobrimos, eu e Marcus, que as nossas namoradas eram irmãs, e aí é que os laços se fecharam.

Como não podia deixar de ser, esse convívio “familiar” com Marcus Vinicius me enriqueceu grandemente. Embora dois anos mais novo que eu, ele me ajudou quase tanto quanto o nosso precioso Jairo. Conversas informais, sugestões de leituras, empréstimos de livros de sua biblioteca caseira... E, claro, opiniões trocadas sobre tudo: vida, arte e mundo. Chegamos a fazer, juntos, uma viagem ao pequeno Picuí, terra de nossas namoradas, no Curimataú paraibano.

Final dos anos sessenta, Marcus mudou-se para o Rio, depois São Paulo, e, durante alguns anos, o perdi de vista. Revi-o depois aqui, em um ou outro Fenart, e mais recentemente, em homenagem que recebeu da Universidade pelo seu trabalho na área musical.

O fundador e mantenedor do Grupo Sanhauá, o mais idoso Marcos dos Anjos, só conheci de fama, avistado de longe, digamos, curtindo seu cuba libre nas mesas da Churrascaria Bambu, ou então, nas calçadas dos cinemas da cidade, entrando ou saindo de uma sessão.

Em compensação, fui vizinho, em Jaguaribe, de dois do Grupo, os irmãos Anco Márcio e Marcus Tavares. Com Anco não tive muito contato, mas com Marcus Tavares mantive amizade desde a escola primária, no Grupo Escolar Sto Antônio, até a vida adulta. Foi ele que, no trote de 68, me deu o banho de lama, quando passei no vestibular para o curso de Letras da Fafi.

Quanto a Sérgio de Castro Pinto, naquela época só o conhecia de vista. Sim, avistava-o vez ou outra nas calçadas do Liceu, em conversa com amigos, mas o poeta de “Gestos Lúcidos” não me via, porque, acho, me olhava pelo seu olho cego.

E para completar o relato, não esqueçamos que o Grupo Sanhauá teve expressão em prosa, com o livro de Emanuel Ponce de Leon, “Linha de limite”. Ora, vejam bem, Ponce é, desde os anos noventa até o presente, uma espécie de irmão por afinidade que tenho e muito prezo, porém, durante os anos sessenta, sequer nos conhecíamos.

Enfim, tempos adiante, já como professor de Teoria do texto poético, na Pós-graduação em Letras da Ufpb, introduzi no programa do curso, para análise e discussão em sala de aula, muitos dos poemas do pessoal do Sanhauá, ao mesmo tempo em que comecei a escrever sobre essa produção poética, a coetânea ao Grupo, ou a posterior. Não sei dizer em que ordem, mas publiquei ensaios críticos – todos no Correio das Artes - sobre Marcus Tavares, Marcus Vinicius e Sergio de Castro Pinto. À poesia deste último dediquei uma tese de doutorado, que virou livro, “Signo e Imagem em Castro Pinto” (1995).

Foi e tem sido esta a minha relação com o Grupo Sanhauá, relação que, se não me fez poeta, me fez crítico. E isso já é muito.


FONTE: Facebook - Acesse

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